Saúde da mulher

Endometriose é uma doença crônica inflamatória que acomete mulheres na idade fértil

Falta de informação e consideração dos sintomas, fazem muitas mulheres continuarem sofrendo com dores e outros sintomas enquanto esperam o diagnóstico

Fotos Rafael Nunes - Especial DP -

Por Joana Bendjouya

A endometriose é uma doença ginecológica inflamatória crônica que se manifesta principalmente na idade reprodutiva. Esta condição é caracterizada pela presença de células do endométrio, que é a mucosa que reveste o interior do útero em outros órgãos da pelve, como trompas, ovários, intestinos e bexiga, ou seja, é quando ela encontra-se fora da cavidade uterina.

Todos os meses, o endométrio fica mais espesso, preparado para que um óvulo fecundado possa se implantar nele. Quando não acontece a gravidez, no final do ciclo ele descama e é expelido na menstruação. Segundo o Cirurgião Oncológico especializado em cirurgia minimamente invasiva, oncoginecologia e cirurgia de endometriose, Filipe Vieira Kwiatkowski, a teoria para explicar o aparecimento de endometriose é que parte desse sangue migra no sentido oposto e acaba caindo nos ovários ou na cavidade abdominal, causando a lesão que resulta na endometriose. Desta forma, a doença pode acometer mulheres a partir da primeira menstruação e pode se estender até a última. “É a menstruação retrógrada, ela reflui pelas trompas para cavidade abdominal, como se fizesse um refluxo”, explica.

A doença pode começar ainda na adolescência e seu diagnóstico muitas vezes se dá entre dez a 15 anos depois do surgimento dos primeiros sintomas. “As mulheres passaram anos com cólicas durante a menstruação, dores e incômodos na relação sexual, muitas fizeram o uso de anticoncepcional por anos, pois não estava nos planos uma gestação e quando param para poder engravidar, acabam que não conseguem engravidar e aí começam as investigações. Nem toda mulher que tem cólica vai desenvolver endometriose, mas é necessário estar atenta aos sinais do corpo, o diagnóstico precoce é um essencial e, para os médicos, ouvir as queixas da paciente e levar em consideração é a chave para o diagnóstico e tratamento”, ressalta o médico.

Sintomas
De acordo com o especialista, os sintomas da endometriose podem mudar de mulher para mulher e da intensidade da doença. Desta forma, o médico orienta que não é necessário sentir todos os que costumam ser mais comuns para buscar uma investigação. “A sintomatologia depende muito do limiar da dor de cada paciente, têm pacientes que têm pequenos focos de endometriose na pelve e apresentam muita dor, porque o limiar da dor delas é um pouco menor. Outros pacientes têm endometriomas volumosos, cistos, aderências e a dor delas não é um sintoma tão importante, então a sintomatologia além dos focos varia de paciente para paciente; é importante ressaltar o todo no tratamento”.

A dor da endometriose pode se manifestar como um dos sintomas, isoladamente, ou ainda uma mistura deles. “Existem mulheres que sofrem dores incapacitantes e outras mais leves, e tem outras que vão apresentar mais outros sintomas; o problema é que as mulheres já associam dor e cólicas no período menstrual como algo comum, e acabam não buscando atendimento médico. Mas é importante ter consciência que a endometriose é uma doença evolutiva, que começa com pequenos focos. Se a paciente não tratar o quanto antes, o quadro pode se agravar ao longo dos anos”, afirma Filipe.

Diagnóstico
O diagnóstico em casos de suspeita da endometriose é feito por meio de exame físico, ultrassom, exame ginecológico, dosagem de marcadores e outros exames de laboratório.
Mas o médico ressalta que o exame classificado como padrão ouro para diagnóstico é a videolaparoscopia com biópsia. “No início da doença os focos podem não aparecer em um exame simples de imagem, neste exame eu consigo enxergar os focos e retirar durante o exame e enviar para análise, mas não é indicado para todas”. Mas como todo o tratamento, os procedimentos também devem ser individualizados.

Segundo o especialista, o tratamento cirúrgico da endometriose é feito principalmente através da videolaparoscopia, uma cirurgia minimamente invasiva. “Costumo dizer que quando for necessária a realização de cirurgia, é como fazer uma roupa sob medida; é sempre individualizada. É preciso tratar o paciente de acordo com o objetivo daquele paciente. Se ela tem dor, se ela tem questões de infertilidade, foi um achado ocasional nos exames de imagem, se ela deseja, ou não, gestação. Todas essas perguntas durante uma consulta são compartilhadas com a paciente e sua família para se tomar a melhor decisão na hora da cirurgia”, enfatiza.


Infertilidade
Cerca de 15% das pacientes com endometriose, de fato, têm dificuldade de engravidar; ou seja, apresentam a doença em seu período reprodutivo. Segundo a ginecologista e obstetra Esther de Souza e Silva Ballester, para as mulheres com endometriose, alguns fatores elevam, ainda mais, o risco de ter infertilidade. Um deles é a distorção da anatomia pélvica, pois as aderências pélvicas ou tubárias prejudicam a liberação dos óvulos. Existem, também, os distúrbios endócrinos e ovulatórios, que também prejudicam a receptividade e a implantação embrionária. “Com as questões inflamatórias o óvulo nem sempre terá a qualidade necessária para gestação, fica muito difícil que ocorra, além do fato de poder apresentar aderência nas trompas, elas podem ficar bloqueadas e não realizar seu funcionamento”, explica.

Como se trata de uma doença inflamatória, a presença dela causa uma inflamação no organismo. Como para ocorrer a fecundação e por consequência a gestação o óvulo precisa encontrar um ambiente saudável.

Para o tratamento a ginecologista explica que o melhor remédio é o que alivia os sintomas e resolve o problema, que pode ser um tratamento com medicamentos, neste caso hormônio, e assim nem sempre a cirurgia será o mais indicado. Além de mudanças no estilo de vida que podem auxiliar no processo de tratamento e principalmente amenizando os sintomas; como realização de atividade física e uma alimentação equilibrada. “A busca pelo tratamento é a melhora na qualidade de vida. Algumas pacientes não melhoram e, se não ocorrer, existe ainda a possibilidade de cirurgia como opção”, orienta.

A ginecologista explica que a cirurgia é um passo importante e muitas vezes indicado, mas que há situações em que o tratamento hormonal pode reparar. Desta forma, cada caso deve ser avaliado individualmente pelos médicos, que para um melhor resultado no tratamento deve ter um acompanhamento e diagnóstico multidisciplinar. “As mudanças de hábitos são fundamentais para auxiliar a paciente a passar pelas crises, a ingestão de alimentos que não aumentem as reações inflamatórias, assim como uma rotina sem tanto estresse auxiliam no tratamento, mas não agem sozinhos, é preciso orientação de profissionais nesse processo; assim como no pós-cirúrgico, caso esta seja a recomendação, ginecologista, cirurgia, nutricionista e se necessário um psicólogo podem ser muito importantes neste processo”, explica.


Diagnóstico adequado e no tempo certo
Para a jornalista Gislaine de Aguiar Rodrigues de 24 anos, assim como para muitas mulheres portadoras de endometriose, a sua experiência envolveu um percurso de muitas consultas com diversos especialistas, a realização de diversos exames sem resultados satisfatórios, medicamentos que não solucionavam as dores e um diagnóstico tardio. “Minha história com a endometriose foi bastante sofrida, eu passei por diversos profissionais, inúmeros tratamentos e muito sofrimento. Eu sempre negligenciei, achava que era uma dor que eu poderia tomar remédios para contornar, que era normal ter cólicas e fluxo intenso. Então eu percebi que já convivia com isso há pelo menos nove anos”, relata.

Gislaine conta que, após ter uma crise severa e não se acomodar com os resultados dos primeiros exames,foram sete meses até receber o diagnóstico de endometriose e ter sua cirurgia agendada. “A dor pélvica que eu tive no ano passado me acompanhou até o dia que fui encaminhada para cirurgia, eu passei na mão de cinco médicos diferentes e uma dezena de exames, incluindo imagem e sangue e ainda assim nada apontava que era endometriose, tomei anti-inflamatório e nada, nenhum diagnóstico e eu sempre achando que não estava normal, que meu corpo estava avisando que algo não estava bem”, relembra. Gislaine conta ainda que, antes de ser encaminhada para cirurgia, mudou hábitos de sua rotina, incluindo alimentação e a prática esportiva, mas que mesmo assim seguiam as dores e desconfortos. “Eu tinha muita dor, mas principalmente muita preocupação. A dor era tão grande que eu tive um problema na perna que limitou os movimentos. Os médicos falavam em diversos diagnósticos, passando por hipóteses como problemas gástricos, intestinais e traumatológicos, a endometriose não era nunca a primeira opção. Sinto que não foram solicitados os exames corretos e as investigações. Depois de sete meses que fiquei com movimentos limitados, uma ginecologista que consultei analisou os exames que já havia feito e disse que eu estava com uma endometriose profunda. Foi um período doloroso, de muita angústia, mas de muito autoconhecimento”, relembra.


Tratamento
Quando se fala de tratamento, o uso de medicamentos hormonais como, por exemplo, o anticoncepcional, fazem parte do primeiro cuidado da doença e buscam evitar a dor e a menstruação, desde que a paciente não tenha a intenção de engravidar em um futuro muito próximo. “Os tratamentos devem visar a melhora da qualidade de vida, além disso, avaliar a realidade e as vontades daquela paciente, se estão nos planos uma gestação, todo tratamento será pensado para cada paciente”, explica Esther.

Mas em muitas situações a cirurgia é a única opção para que a paciente, de fato, não sofra mais com os sintomas e incômodos. “Profissionais que não se atentam para os sintomas das pacientes e os tratam como se fossem cólicas comuns no período menstrual, tratando como algo comum, ou mesmo por dificuldade técnica para identificar a presença da endometriose nos exames de imagem, retardam o tratamento”, alerta a ginecologista.

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