Sobre o Luto

Confira o porquê dos cinco estágios e a importância de atravessar por este período entendendo cada momento

Psicóloga explica que o sofrimento decorrente de uma perda pode variar e não costuma ser linear

Foto: Divulgação - DP - Não existe fórmula única para lidar com uma perda

Por Joana Bendjouya

Um olhar mais contemporâneo aponta que o luto é um processo que corresponde a uma perda vivida. Como em um movimento oscilador, o enlutado navega entre a dor e a reorganização da vida naquele novo contexto. Este sofrimento decorrente de uma perda é uma experiência individual e não têm um fim, ele irá passar por processos de transformação, conforme explica a psicóloga Raquel Barboza Lhullier, que trabalha com terapia focada na compaixão. “Viver o luto é reaprender a lidar com a vida que segue existindo lá fora e o mundo interno presumido que desabou. Quando perdas (esperadas ou não) acontecem, nossas suposições são destruídas e existe um desequilíbrio interno”.

Segundo a psicóloga, durante esse processo a pessoa pode experimentar diversos sentimentos que podem ser sentidos em períodos isolados, ou ainda, ao mesmo tempo. “O luto é uma resposta humana natural diante de perdas de morte e não morte, um processo adaptativo na busca por um sentimento de segurança que nos ajuda a integrar a perda de um vínculo de apego rompido”, explica.

Como definir o luto
O significado transcende a tristeza, abrangendo uma amplitude de emoções e reações, que podem variar em intensidade e também duração. Raquel explica ainda que esses sentimentos podem se alternar, se sobrepor ou ainda ocorrer em diferentes momentos do processo. “A dor do luto varia de pessoa para pessoa e pode ser influenciada por fatores como cultura, crenças religiosas, histórico familiar e personalidade. Por isso, é uma jornada única, que cada indivíduo enfrenta de maneira diferente, mas é essencial para o processo de cura e readaptação à nova realidade após a perda”, comenta.

Quando o luto não é por morte
Apesar de ser uma experiência individual e única, a maneira como cada pessoa enfrenta o processo tem um impacto significativo também na vida de quem convive e está envolvido nas dinâmicas familiares e sociais. Podendo ser classificado como um processo natural e multifacetado, que envolve a experiência de lidar com a perda de alguém ou algo, se trata de uma resposta emocional natural e inevitável.

A psicóloga explica ainda que é preciso ira além da leitura de perda relacionada a pessoas. Podendo ocorrer em outras situações, como o fim de um relacionamento, a perda de um emprego, mudanças na saúde física ou mental e outras transições classificadas como importantes na vida de cada um. “Em relação a papéis que desempenhamos, o que nos guia e o que pensamos a nosso respeito, e inclusive nossos valores, o luto envolve tudo isso, quem faz parte do nosso mundo de segurança (famílias, amigos), como nos percebemos nos nossos grupos sociais, e como somos percebidos socialmente”.

Sobre luto e morte
Quando se trata de um processo de luto diante da perda de um ente querido, Raquel explica que existe uma mistura de sentimentos e de conflitos sobre como viver e organizar a vida após esta perda. Cada pessoa irá responder, encarar e agir de maneiras diferentes diante desta experiência, que será consequência de suas culturas, crenças e quantidades de perdas anteriores que já sofreram. “Quando pensamos sobre os cinco estágios do luto segundo Elisabeth Kübler-Ross, pioneira no movimento dos estudos sobre a morte e o morrer, ela classifica que eles são muito variáveis para cada pessoa, não é um processo progressivo e não é linear. A ideia distorcida de que o processo é uma linha reta pode causar muito sofrimento para a pessoa que acredita que o luto deve chegar em determinada etapa e ser concluído, mas não existe um luto que termina.”

Esse período será vivido de forma gradual e, segundo menciona a psicóloga, dividido em cinco estágios que não precisam necessariamente acontecer em apenas um momento. Fazem parte desta etapa os sentimentos de negação, raiva, barganha. Já a depressão e a aceitação podem aparecer em momentos diferentes.
Negação

Esta é uma resposta instintiva à dor e ao choque da perda. Nesta fase, a pessoa costuma criar uma barreira temporária para proteger a si mesma do impacto emocional. A negação permite um tempo para processar a notícia e se preparar para lidar com a realidade. Com o tempo, essa negação começa a desaparecer, dando lugar a outras emoções.


Raiva
À medida que o processo de aceitação da realidade, e de enfrentar a perda começa a progredir, é o período em que a raiva costuma surgir. Neste momento a pessoa começa a se ver nesta situação como injustiçada ou traída, podendo ainda essa emoção ser direcionada a outras pessoas, como familiares, amigos, ou até mesmo quem partiu.
“Nesta fase, é comum ouvir questionamentos como ‘por que isso aconteceu comigo?’ ou ‘não é justo’. É importante se permitir sentir raiva e expressar de maneira saudável, como através de conversas, escrita ou atividades físicas”, orienta Raquel.
Barganha

Marcada por um desejo de reverter ou aliviar a dor da perda, assim costuma ser vivido este estágio. Essa fase reflete a busca desesperada por algum controle sobre a situação, mas é importante ter conhecimento que nem todas as circunstâncias estarão sob controle. À medida que a pessoa irá vivendo o processo do luto, a necessidade de barganhar tende a diminuir.


Depressão
Uma resposta natural à perda costuma ser o momento em que a pessoa realmente sente o peso da ausência, podendo experimentar profunda tristeza, desânimo e desinteresse pelas atividades diárias. Essas alterações podem ser percebidas através de alterações no apetite, no sono e na concentração. “Nesta etapa, é essencial buscar apoio emocional e, caso necessário, acompanhamento profissional para enfrentar a dor e evitar o agravamento dos sintomas”, orienta Raquel.
Aceitação

Raquel explica que, independentemente de qual foi a ordem vivida das demais etapas, a aceitação pode ser classificada como o último estágio do luto, no qual a pessoa começa a se adaptar à nova realidade sem a presença do que a fez entrar neste ciclo de sentimentos. Isto não significa que a pessoa esqueceu ou superou completamente a perda, mas sim que está aprendendo a viver com ela e reorganizando sua rotina. “A pessoa pode começar a encontrar novos interesses, estabelecer novos objetivos e criar outros vínculos. A aceitação é um processo contínuo e a pessoa pode oscilar entre os estágios antes de finalmente encontrar a paz e a resiliência para seguir em frente” observa a psicóloga.

Quanto tempo dura?
O período do luto é uma experiência única e particular. Isso significa que a duração dele varia de acordo com uma série de fatores, como a natureza da perda, em caso de morte, a relação com a pessoa que faleceu, e o apoio emocional disponível para aquele momento. Desta forma, não há um prazo específico para o fim, sendo essencial respeitar o tempo que cada um leva para processar e lidar com este momento de perda.

A psicóloga ressalta que é importante lembrar que é normal a pessoa oscilar entre diferentes emoções e fases ao longo do tempo. Vivenciar o luto é uma experiência muito subjetiva, que pode ser sentida e expressa não apenas por emoções, mas reações corporais, mudanças comportamentais, alterações na forma de pensar e encarar a nova realidade do sujeito. "No luto não temos um ponto final, mas momentos de alívio. Ao invés de tentar suprimir, ele é um processo adaptativo que precisa ser vivenciado e por isso é tão importante uma rede de apoio, de escuta atenta e acolhimento à dor e ao sofrimento do enlutado”, esclarece Raquel.

Como lidar
Algumas abordagens podem auxiliar na superação dessa fase difícil, como se permitir sentir as dores deste momento, buscar apoio, ter uma rotina de autocuidado e ser paciente com este período que está vivendo. Embora seja um processo natural e muitas pessoas consigam lidar com a dor por conta própria, em alguns casos a ajuda profissional pode ser necessária. No caso das crianças, Raquel sugere que recorrer a atitudes lúdicas e usando a simbologia, pode auxiliar este período. "Além de oferecer o espaço para as crianças se expressarem emocionalmente através da fala, incentive que ela faça algum tipo de homenagem para quem partiu na forma de desenho ou carta. Uma outra maneira de se despedir e prestar homenagens é criar uma caixa de memórias em que eventualmente sempre que a criança desejar pode recorrer aquele local em que ela pode se conectar emocionalmente a alguém que sempre foi muito especial para ela e assim seguirá dentro do seu coração”, orienta.

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